A variabilidade linguística do português brasileiro não surgiu por acaso. Antes, a dinâmica linguística que vivenciamos pode ter suas relações com o passado remoto, tão distante quanto os tempos pré-coloniais, rastreada, estabelecida e estudada.
Dentre os aspectos históricos relacionados com a formação social do povo brasileiro e as resultantes variações linguísticas no PB*, podem-se destacar os seguintes: (1) a influência dos povos indígenas; (2) a contribuição dos africanos; e (3) a imigração de europeus.
Acredita-se que havia, no ano de 1500, entre 1 e 6 milhões de indígenas no que hoje é o território brasileiro, com suas cerca de 300 línguas diferentes. Não era de se esperar que da noite para o dia todos começassem a falar a língua portuguesa. Ao contrário, sua implantação foi um processo lento, que incluiu a predominância de “línguas gerais” (a paulista, a amazônica e a de base cariri) por um período de aproximadamente 300 anos, contados a partir de 1500. A “língua geral”, de acordo com MATOS e SILVA (2004), era um “português simplificado com interferências das línguas indígenas e também das africanas”.
Um exemplo da influência das línguas indígenas sobre a variabilidade linguística está na contribuição massiva para o léxico do PB. Do tupi-guarani, por exemplo, o português brasileiro absorveu cerca de dez mil palavras, em sua maioria topônimos, antropônimos e substantivos comuns.
Embora não exista comprovação de influência fonológica ou gramatical das línguas indígenas no PB, é curioso o que se observa no estudo dos índios do tronco macrojê. Algumas tribos ligadas a esse tronco, que não era nômade, que habitavam o Vale do Paraíba, no Estado de São Paulo, possuíam o “r” retroflexo, também presente no falar caipira, comum entre habitantes do interior daquele estado.
Um segundo fator a ser considerado na caracterização do PB é a influência dos africanos trazidos ao Brasil. Embora haja divergências quanto ao número aproximado, acredita-se que 18 milhões de escravos africanos, das culturas banto e sudanesa, chegaram ao Brasil entre 1538 e 1855, trazendo sua língua, sua cultura e, consequentemente, sua influência sobre as estruturas social e linguística aqui existentes.
Contribuições importantes foram feitas ao léxico por parte dessas culturas. Palavras como lenga-lenga, moleque, cachaça, beleléu e zonzo, fazem parte do legado de cerca de 300 palavras africanas incorporadas ao PB (CASTRO, 1980).
Por fim, mais recente e menos importante que as influências indígena e africana, o português do Brasil foi também influenciado em sua caracterização pela imigração de europeus a partir da segunda metade do século XIX, especialmente depois de 1870. Um quadro que combinava problemas econômicos na Europa, libertação dos escravos e expansão da agricultura brasileira, despertou o interesse de muitos italianos, espanhóis, alemães e portugueses, pelo Brasil.
Diferentes dos africanos, os imigrantes europeus, ao chegarem ao Brasil, já encontraram uma língua nacional, resultado de um movimento pela promoção da “linguagem brasileira”, iniciado em 1826. Embora isso talvez tenha reduzido o impacto da influência desses imigrantes europeus sobre a variabilidade da língua aqui falada, certamente não a anulou por inteiro, visto que pode ser claramente notada, em especial, nas regiões Sul e Sudeste do país.
À luz dos três aspectos considerados acima, a variabilidade linguística no português do Brasil pode ser mais bem compreendida em sua relação com os aspectos sócio-históricos que lhes deram origem.
*PB - Português do Brasil
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WV
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